
O Carnaval de Arlequim, de Miró

Este Miró porque sim, e também porque está aqui sempre ao meu lado, na parede junto à secretária. Trouxe-o em 2004 de Paris, do Centro Pompidou, depois de uma tarde inteira submersa numa exposição dessa pintura-poesia, pintura do sonho, "1917-1934: La naissance du monde". Uma daquelas tardes parisiennes que não se esquecem nunca.
E ao olhar o Miró na parede vejo na estante ao lado um Vinicius velhinho que ando a procurar há tanto tempo e afinal estava ali, no V em vez do M, por isso não o encontrava. Meio amarelento, ainda é do tempo da Faculdade de Letras, das tertúlias gostosas; uma amiga foi de férias ao Brasil: queres que te traga alguma coisa? Um Vinicius, não consigo encontrar nada por aqui. Estava-se nos anos 80, Vinicius tinha morrido há pouco.
Abro ao calhas e as palavras saltam-me aos olhos, cansadas de estarem ali fechadas.
MARINHA
Na praia de coisas brancas
Abrem-se às ondas cativas
Conchas brancas, coxas brancas
Águas-vivas
Aos mergulhares do bando
Afloram perspectivas
Redondas, se aglutinando
Volitivas.
E as ondas de pontas roxas
Vão e vêm, verdes e esquivas
Vagabundas, como frouxas
Entre vivas!
Vinicius de Moraes, in Antologia Poética, 19ª ed., Livraria José Olympio Editora, Rio de Janeiro, 1981
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