"Ninguém existe só para testemunhar um acto perdido
ele encontra-nos
e nós apanhamo-lo guardando-o no bolso do casaco"
(Ana Viana, Memórias do Desapego)
ele encontra-nos
e nós apanhamo-lo guardando-o no bolso do casaco"
(Ana Viana, Memórias do Desapego)
Não existem actos perdidos apenas
actos mais ou menos encontrados
e não se pode perder um acto somente
porque se desejou perdê-lo
- se é possível viável provável alguém realmente querer perder um acto
Ao desejar perdê-lo ele apega-se-nos ainda mais à pele
entranha-se o acto em nós não nos livramos mais dele
do acto
Como em tudo também aqui tudo é relativo
e em estreita dependência - embora sem convergência -
da força do acto
melhor será dizer: da força do encontro com o acto
com o acto em si
Com efeito efectivamente
um acto fracamente encontrado
será pois mais fácil de perder
ainda que nunca se perca totalmente
o acto fraco
que mesmo sendo fraco tem a sua força
e há pelo menos sempre uma ponta
de acto
ainda que seja ponta de acto fraco
que resiste persiste
já coberto de pó e teias de aranha
mas existe
Agora se o acto foi encontrado forte
mesmo que não desejado esse encontro
fruto de um acaso, um azar, uma sorte
nem que se esperneie e esbraceje
furiosamente
para reprimir castigar afugentar
o acto
nem que se chore ou ria desalmadamente
de contentamento ou descontente
nunca
o acto
será
perdido
Ali ficará colado alapado
a engordar da alma
a chupá-la
escondido o acto na cabeleira ou até no buraco do ouvido
jamais se deixando ser esquecido
Se o acto
que já todos sabemos ser forte
também for inteligente
conseguirá até
pa ra do xal men te
fortalecer-se
(sacana do acto!)
no próprio esquecimento
que mais não é do que máscara
coisa aparente que a si própria põe a gente
quando se quer livrar de uma qualquer memória que chateia
que fica mal na história
Um acto forte perdido é fodido!
Bárbara Pais, in Não Sei Falar de Mim, inédito, 2008
Foto: Isabel Solano
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